"A conduta é um espelho no qual todos exibem a sua imagem." (Johann Wolfgang Goethe)
Certo dia, um casal ao chegar do trabalho,
encontrou algumas pessoas dentro de sua casa. Achando que eram ladrões, marido
e mulher ficaram assustados, mas um homem forte e saudável, com corpo de
halterofilista disse:
- Calma, pessoal, nós somos velhos conhecidos
e estamos em toda parte do mundo.
- Mas, quem são vocês? - pergunta a mulher.
- Eu sou a Preguiça - responde o homem másculo.
Estamos aqui para que vocês escolham um de nós para sair definitivamente da
vida de vocês.
- Como pode ser a preguiça se tem um corpo de
atleta que vive malhando e praticando esportes? - indagou a mulher.
- A Preguiça é forte como um touro e pesa toneladas
nos ombros dos preguiçosos; com ela ninguém pode chegar a ser um vencedor.
Uma mulher velha, curvada, com a pele muito
enrugada, que mais parecia uma bruxa diz:
- Eu, meus filhos sou a Luxúria.
- Não é possível! - diz o homem - Você não pode
atrair ninguém com essa feiúra.
- Não há feiúra para a luxúria, queridos. Sou velha
porque existo há muito tempo entre os homens; sou capaz de destruir famílias
inteiras, perverter crianças e trazer doenças para todos até a morte. Sou
astuta e posso me disfarçar no mais belo ser.
E um mal cheiroso homem,
vestindo roupas maltrapilhas, que mais parecia um mendigo, diz:
- Eu sou a Cobiça. Por mim
muitos já mataram, por mim muitos abandonaram famílias e pátria; sou tão antigo
quanto a Luxúria, mas eu não dependo dela para existir.
- E eu, eu sou a Gula - diz
uma lindíssima mulher com um corpo escultural e cintura finíssima. Seus
contornos eram perfeitos e tudo no corpo dela tinha harmonia de forma e
movimentos.
Assustam-se os donos
da casa, e a mulher diz:
- Sempre imaginei que a
gula seria gorda.
- Isso é o que vocês
pensam! - responde ela - Sou bela e atraente, porque se assim não fosse seria
muito fácil livrarem-se de mim. Minha natureza é delicada, normalmente sou
discreta, quem tem a mim não se apercebe, mostro-me sempre disposta a ajudar na
busca da luxúria.
Sentado em uma
cadeira num canto da casa, um senhor, também velho, mas com o semblante
bastante sereno, com voz doce e movimentos suaves, diz:
- Eu sou a Ira. Alguns me
conhecem como cólera. Tenho muitos milênios também. Não sou homem, nem mulher,
assim como meus companheiros que estão aqui.
- Ira? Parece mais o vovô
que todos gostariam de ter! Diz a dona da casa.
- E a grande maioria me
tem! - responde o vovô - Matam com crueldade, provocam brigas horríveis e
destroem cidades quando me aproximo. Sou capaz de eliminar qualquer sentimento
diferente de mim, posso estar em qualquer lugar e penetrar nas mais protegidas
casas. Mostro-me calmo e sereno para mostrar-lhes que a Ira pode estar no
aparentemente manso. Posso também ficar contido no íntimo das pessoas sem me
manifestar, provocando úlceras, câncer e as mais temíveis doenças.
- E eu sou a Inveja.
Faço parte da história do homem desde a sua criação,
- diz uma jovem que
ostentava uma coroa de ouro cravada de diamantes, usava braceletes de
brilhantes e roupas de fino pano, assemelhando-se a uma princesa rica e
poderosa.
Como "inveja", se
é rica e bonita e parece ter tudo o que deseja? – diz a mulher da casa.
- Há os que são ricos, os
que são os poderosos, os que são famosos e os que não são nada disso, mas eu
estou entre todos. A inveja surge pelo que não se tem e o que não se tem é a
felicidade. Felicidade depende de amor, e isso é o que mais carece a
humanidade... Onde eu estou está também a Tristeza.
Enquanto os invasores se
explicavam, um garoto, que aparentava cerca de cinco a seis anos, brincava pela
casa. Sorridente e de aparência inocente, característica das crianças, sua face
de delicados traços mostravam a plenitude da jovialidade, olhos vívidos...
- E você, garoto, o que faz
junto a esses que parecem ser a personificação do mal?
O garoto responde com
um sorriso largo e olhar profundo:
- Eu sou o Orgulho.
- Orgulho? Mas você é
apenas uma criança! Tão inocente como todas as outras!
O semblante do garoto
tomou um ar de seriedade que assustou o casal, e ele então diz:
- O orgulho é como uma
criança mesmo, mostra-se inocente e inofensivo, mas não se enganem, sou tão
destrutível quanto todos aqui. Quer brincar comigo?
A Preguiça interrompe
a conversa e diz:
- Vocês devem escolher quem
de nós sairá definitivamente de suas vidas. Queremos uma resposta.
O homem da casa
responde:
- Por favor, dêem-nos dez
minutos para que possamos pensar.
O casal se dirige para seu
quarto e lá fazem várias considerações. Dez minutos depois retornam.
- E então? - pergunta a
Gula.
- Queremos que o Orgulho
saia de nossas vidas!
O garoto olha com um olhar
fulminante para o casal, pois queria continuar ali. Porém, respeitando a
decisão, dirige-se para a saída. Os outros, em silêncio, iam acompanhando o
garoto quando o homem da casa pergunta:
- Hei! Vocês vão embora
também?!
O garoto, agora com
ar severo e com a voz forte de um orador experiente, diz:
- Escolheram que o Orgulho
saísse de suas vidas e fizeram a melhor escolha. Porque onde há orgulho não há
preguiça, pois os preguiçosos são aqueles que se orgulham de nada fazer para
viver, não percebendo que na verdade vegetam. Onde há orgulho não há luxúria,
pois os luxuriosos têm orgulho de seus corpos e julgam-se merecedores. Onde há
orgulho não há cobiça, pois os cobiçosos têm orgulho das migalhas que possuem,
juntando tesouros na terra e invejando a felicidade alheia, não percebendo que
na verdade são instrumentos do dinheiro. Onde não há orgulho não há gula, pois
os gulosos se orgulham de sua condição e jamais admitem que o são, arrumam
desculpas para justificar a gula, não percebendo que na verdade são marionetes
dos desejos. Onde não há orgulho, não há ira, pois os irosos com facilidade
destroem àqueles que, segundo o próprio julgamento, não são perfeitos, não
percebendo que na verdade sua ira é resultado de suas próprias imperfeições.
Onde não há orgulho não há inveja, pois os invejosos sentem o orgulho ferido ao
verem o sucesso alheio seja ele qual for; precisam constantemente superar os
demais nas conquistas, não percebendo que, na verdade, são ferramentas da
insegurança.
Saíram todos sem olhar para
trás e, ao baterem a porta, um fulminante raio de luz invadiu o recinto.
"A soberba do homem o abaterá, mas a
honra sustentará o humilde de espírito". (Provérbios 29:23)
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